Títulos do Tesouro americano perdem status de porto seguro
Títulos do Tesouro americano já não são vistos como o abrigo infalível das finanças globais. Com rendimentos de cerca de 3,6% ao ano para papéis de 1 e 5 anos e acima de 4,6% para vencimentos de 20 e 30 anos, os treasuries parecem atrativos, mas refletem uma precificação de riscos inéditos.
Desde o início da guerra tarifária dos Estados Unidos, em abril, a inflação elevada, a dívida pública crescente e a desvalorização do dólar pressionam esses papéis. A venda maciça de títulos elevou as taxas em mais de um ponto percentual, cenário que especialistas classificam como um reposicionamento de risco necessário.
Títulos do Tesouro americano perdem status de porto seguro
André Moura, sócio da Nau Capital, lembra que “renda fixa não tem nada de fixa” quando há possibilidade de resgate antecipado e volatilidade cambial. De acordo com o gestor, a expectativa de inflação de 2,9% ao ano até 2025 corrói a maior parte do rendimento real dos títulos curtos. Para obter retorno superior, o investidor precisaria optar por prazos mais longos, ficando exposto à marcação a mercado.
Inflação e marcação a mercado elevam o risco
Uma simulação da Nau mostra o impacto desse fenômeno: quem compra US$ 100 mil em títulos de 10 anos a 5% a.a. acumularia US$ 115 mil em três anos se as taxas permanecessem estáveis. Porém, uma elevação dos juros para 8% no quarto ano resultaria em desvalorização aproximada de 20%, reduzindo o valor a US$ 92 mil.
Câmbio pressiona retorno em dólar
Além do componente de juros, o risco cambial se intensifica. Em 2024, o euro subiu 14% ante o dólar, a libra 8% e o real 15%, o que pode anular ganhos na conversão. Segundo Moura, a expectativa do mercado é de prolongada fraqueza do dólar, impulsionada pela diversificação de reservas de bancos centrais para outras moedas e para o ouro.
A dívida pública dos EUA, hoje equivalente a 120% do PIB, também preocupa. Economistas alertam que, caso esse índice se aproxime de 150%, até mesmo a maior economia do mundo enfrentará desafios para financiar seus compromissos. Dados históricos mostram que nos anos 1990 as taxas americanas já atingiram 8% e, no início dos anos 1980, chegaram a 20% sob o comando de Paul Volcker no Federal Reserve.

Imagem: Internet
Como lembrou o prêmio Nobel Harry Markowitz, o único “free lunch” é a diversificação. Investidores têm buscado outras moedas, entre elas iene, coroa norueguesa, dólar australiano e mesmo o real, em busca de proteção contra a volatilidade dos ativos americanos. Mais detalhes sobre o comportamento recente dos yields podem ser conferidos no Departamento do Tesouro dos Estados Unidos.
Em síntese, os treasuries continuam relevantes, mas perderam o status de porto seguro absoluto. Avaliar inflação, marcação a mercado e câmbio tornou-se indispensável antes de investir.
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