Tailândia firma acordo de última hora e reduz tarifa dos EUA de 36% para 19%
Dois dias antes do limite estabelecido pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, a Tailândia concluiu em Washington um acordo que reduz de 36% para 19% a tarifa de importação aplicada a seus produtos. O entendimento encerra quatro meses de incerteza após o anúncio, em 2 de abril, de uma nova rodada de tarifas que chegava a 49% para algumas economias do Sudeste Asiático.
A região, cujo modelo de crescimento se apoia nas exportações, reagiu rapidamente à medida norte-americana. Em 2024, os dez membros da Associação de Nações do Sudeste Asiático (Asean) venderam US$ 477 bilhões em bens aos Estados Unidos. A Tailândia respondeu por US$ 63 bilhões, cerca de um quinto de seu total exportado, e passou a negociar sob pressão para proteger setores como eletrônicos, autopeças e bens de consumo.
O primeiro país a selar um pacto foi o Vietnã, maior dependente das vendas ao mercado norte-americano. O governo de Hanói aceitou reduzir o imposto de 46% para 20%. Trump declarou que o Vietnã zerará tarifas sobre todos os itens vindos dos EUA, afirmação que não foi confirmada oficialmente pelos vietnamitas. Indonésia e Filipinas trataram em seguida e também fixaram suas alíquotas em 19%, embora não dependam intensamente do comércio com os Estados Unidos.
A delegação tailandesa demorou a entrar no circuito. Analistas apontam obstáculos internos, entre eles o caráter fragmentado do atual governo de coalizão e a necessidade de conciliar interesses empresariais divergentes. Tensões diplomáticas ainda agravaram o cenário: em fevereiro, Bangcoc repatriou 40 uigures para a China, contrariando alertas de Washington, e um pesquisador norte-americano foi processado por crime de lesa-majestade. Esses episódios, relatados por negociadores, foram lembrados repetidamente pela equipe dos EUA durante as conversas.
O principal ponto de discórdia, contudo, concentrou-se no acesso ao mercado agrícola tailandês, historicamente protegido. A Casa Branca exigiu redução ou eliminação de barreiras para carne suína, aves e grãos. O agronegócio local possui peso relevante: conglomerados como o CP Group lideram a produção de alimentos no país e atuaram contra a abertura ampla. Criadores de suínos alertaram que a escala e o custo de produção norte-americanos tornariam a concorrência inviável, caso as alíquotas caíssem a zero.
Enquanto produtores rurais buscavam manter tarifas, a indústria de transformação pressionava por um acordo rápido. Fabricantes de componentes de borracha e de eletrônicos estimam margens reduzidas e afirmavam ser possível absorver impostos até 25%, mas não 36%. Parte dessas empresas destina cerca de 20% da receita diretamente ao mercado norte-americano, porcentual que sobe quando se consideram produtos embarcados por terceiros com partes fabricadas na Tailândia.
Além da alíquota, executivos mostram preocupação com a acusação de “trans-shipment” – prática na qual mercadorias chinesas seriam desviadas para o Sudeste Asiático apenas para escapar das tarifas contra Pequim. Trump anunciou que itens considerados desviados pagariam 40%, o dobro do novo teto negociado. A cadeia de suprimentos tailandesa depende fortemente de insumos chineses e de países vizinhos, o que torna incerto o critério que o governo norte-americano utilizará para classificar a origem dos bens.

Imagem: bbc.com
Pelas regras da Organização Mundial do Comércio, um produto é considerado local quando ao menos 40% de seu valor é agregado no país de exportação ou quando passa por transformação substancial. A administração Trump, entretanto, tem ignorado esses parâmetros. Empresários temem que a exigência de conteúdos nacionais superiores a 50% inviabilize a certificação de origem nos moldes norte-americanos e desorganize cadeias instaladas há décadas.
Apesar das lacunas, a equipe econômica tailandesa avalia ter evitado um impacto imediato maior sobre manufaturas. Os detalhes técnicos do acordo – como cronogramas de redução tarifária, salvaguardas e compromissos agrícolas – deverão ser discutidos nos próximos anos, prática comum em pactos comerciais extensos. Fontes do governo em Bangcoc classificam o resultado como um alívio temporário diante da imprevisibilidade da política tarifária dos Estados Unidos.
Enquanto isso, outros parceiros continuam a negociar. Japão e Coreia do Sul, aliados tradicionais de Washington, também enfrentam pressões para abrir setores sensíveis. Índia ainda resiste aos pedidos norte-americanos de ampliação de acesso a seu mercado agrícola. Em meio a esse cenário, executivos de todo o Sudeste Asiático afirmam aguardar definições claras para planejar investimentos, temendo mudanças unilaterais que possam surgir a qualquer momento.
Para a Tailândia, o desafio agora é equilibrar as exigências dos EUA com a proteção de produtores domésticos, sem afastar novos aportes estrangeiros. Empresários locais recordam que parte do fluxo de capitais recebido nos últimos anos decorre justamente do deslocamento de fábricas chinesas após as primeiras tarifas impostas por Trump. Qualquer regra que limite insumos da China poderia, portanto, reduzir a atratividade do país como plataforma exportadora.
Apesar das incertezas, o acordo fechado antes do prazo de 1º de agosto evita, por ora, a aplicação da tarifa de 36% que vigoraria automaticamente. A redução para 19% não elimina o custo extra, mas é considerada administrável pelos principais setores exportadores. Até que as cláusulas finais sejam divulgadas, o governo tailandês e a indústria seguem monitorando eventuais mudanças de rumo em Washington, cientes de que novas rodadas de tarifas podem surgir a qualquer momento.