Projeto que pune devedores contumazes enfrenta impasse na Câmara

Projeto que pune devedores contumazes enfrenta impasse na Câmara

O Código de Defesa dos Contribuintes, aprovado por unanimidade no Senado na sequência da Operação Carbono Oculto da Polícia Federal, pode perder ritmo na Câmara dos Deputados. A proposta estabelece critérios para classificar o chamado devedor contumaz e cria novos mecanismos de fiscalização nos sectores de combustíveis e serviços financeiros digitais.

Critérios para identificar o devedor contumaz

O texto define como devedor contumaz, no âmbito federal, a empresa que acumula dívida fiscal injustificada superior a 15 milhões de reais, montante que também represente pelo menos 100 % do património conhecido do contribuinte. Em estados e municípios, a classificação aplica-se a dívidas reiteradas durante quatro períodos consecutivos de apuramento de tributos.

O objetivo é travar estruturas empresariais que utilizam a inadimplência fiscal como estratégia de negócio. Segundo especialistas ouvidos pelo Legislativo, a prática prejudica a concorrência e elimina receitas públicas, criando ambiente favorável à actuação de organizações criminosas.

Regras adicionais para o sector de combustíveis

Para restringir a entrada de empresas sem capacidade financeira real, a proposta atribui à Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) competência para fixar requisitos mínimos de capital social e comprovar a origem dos recursos de investidores.

• Postos de combustíveis terão de apresentar capital de pelo menos 1 milhão de reais.
• Distribuidoras precisarão de 10 milhões de reais.
• Empresas de produção de combustíveis necessitarão de 200 milhões de reais.

A ANP deverá ainda verificar a composição societária de cada empresa, visando reduzir o uso de «laranjas» e limitar a infiltração de grupos ligados ao crime organizado.

Fintechs passam ao radar do sistema de pagamentos

O projecto incorpora as fintechs ao Sistema de Pagamentos Brasileiro. Com a inclusão, essas empresas ficarão sujeitas a regras específicas a serem definidas pelo Poder Executivo, em colaboração com o Ministério da Fazenda. A medida procura aumentar a transparência das movimentações financeiras e fortalecer o combate à lavagem de dinheiro.

Caminho político e possíveis entraves

A rápida aprovação no Senado ocorreu uma semana após a operação da Polícia Federal que expôs fraudes no mercado de combustíveis. Contudo, na Câmara dos Deputados o cenário apresenta-se menos favorável. Parlamentares e analistas relataram que o calendário eleitoral e a pressão de sectores económicos contrários podem atrasar a análise da matéria.

Consultorias de acompanhamento legislativo comparam a trajectória do novo código ao Projeto de Lei 15/2024, enviado pelo Executivo no ano passado para incentivar a conformidade tributária. Esse texto, que apresenta programas de cooperação entre Fisco e contribuintes, tem avançado de forma lenta e fragmentada.

Impacto aguardado pelo Fisco

De acordo com juristas especializados em direito tributário, a criação de critérios objectivos para determinar o devedor contumaz facilitará a aplicação de sanções, como inscrição em dívida activa, restrição a incentivos fiscais e eventual responsabilização criminal de gestores. A expectativa é reduzir o espaço para litígios prolongados e elevar a recuperação de receitas sonegadas.

Representantes do sector público alertam que a demora na tramitação ameaça anular o efeito dissuasor conquistado após a ofensiva policial. Para esses agentes, a aprovação célere na Câmara seria fundamental para manter o foco sobre redes que utilizam esquemas de sonegação para ganhar vantagem competitiva.

Próximos passos

O projecto aguarda distribuição a comissões temáticas, onde poderá receber emendas. Caso o texto seja alterado, regressará ao Senado para nova apreciação. Líderes partidários ainda não definiram data para votação em plenário.

Enquanto isso, organizações empresariais favoráveis à proposta intensificam contactos para pressionar pela sua aprovação, argumentando que a medida promove a concorrência leal e protege os cofres públicos. Do lado oposto, entidades do sector de combustíveis e grupos de serviços financeiros defendem ajustes, alegando risco de aumento de custos e burocracia.

O desfecho dependerá da capacidade do governo de articular apoio no Congresso e da disposição dos deputados em priorizar a pauta tributária num ano marcado por disputas eleitorais regionais.

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