A ofensiva chinesa no mercado automotivo brasileiro: 16 marcas estarão nas ruas até 2025
Até o fim de 2025, 16 fabricantes chinesas terão veículos circulando no Brasil, fenômeno que altera a dinâmica de um setor dominado por montadoras instaladas há décadas no país. A chegada em massa se apoia em preços competitivos, portfólio focado em eletrificação e produção local crescente, fatores que já se refletem nas estatísticas de vendas e na pauta de importações.
Participação crescente e novos nomes nas tabelas de vendas
Dados da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) mostram que automóveis leves provenientes da China responderam por 62,1% de todos os importados no primeiro semestre de 2025. Somadas, BYD, Caoa Chery e Great Wall Motors (GWM) venderam 110.856 unidades de janeiro a julho, avanço anual de 26,5% e fatia de mercado de 10,46%. Se consideradas como um bloco, essas três marcas ocupariam a quarta posição no ranking nacional, atrás apenas de Volkswagen, Fiat e General Motors.
Em julho, cinco empresas chinesas (BYD, Caoa Chery, GWM, GAC e Omoda & Jaecoo) figuraram entre as marcas mais vendidas pela Fenabrave, entidade das concessionárias. Juntas, responderam por 11,9% dos emplacamentos do mês, incremento de 48% em relação ao mesmo período de 2024.
A lista de fabricantes chinesas com presença confirmada no país, via produção local ou importação, inclui JAC, Chery, BYD, GWM, Neta, Omoda & Jaecoo, GAC, Zeekr, SAIC, Leapmotor, Geely, Changan, FAW, Dongfeng e BAIC (esta última já presente no segmento de caminhões por meio da Foton). Esse movimento reforça a previsão de que 16 marcas da China atuarão simultaneamente no mercado brasileiro até o fim do próximo ano.
GWM inaugura fábrica e amplia capacidade nacional
Um dos principais vetores dessa expansão, a Great Wall Motors inaugura em 15 de agosto sua planta em Iracemápolis (SP), cerimônia que contará com a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A empresa programou produzir inicialmente 30 mil veículos por ano e alcançar rapidamente 50 mil unidades, volume muito superior às 6 mil a 8 mil unidades fabricadas no mesmo local quando a linha pertencia à Mercedes-Benz.
O investimento previsto pela GWM soma R$ 10 bilhões até 2032, dos quais R$ 4 bilhões já autorizados para a fase que vai até 2026. A operação emprega atualmente 530 profissionais e o quadro deve atingir cerca de mil colaboradores até dezembro, quando o segundo turno de produção entra em vigor.
A montadora dedicará 60% da capacidade ao utilitário esportivo Haval H6, oferecido em versões híbrida convencional e híbrida plug-in. Os outros 40% contemplam a picape Poer e o SUV Haval H9, ambos movidos a diesel e direcionados principalmente ao agronegócio do Centro-Oeste. A empresa avalia eletrificar esses modelos no futuro e desenvolve, em parceria com fornecedores locais, tecnologia híbrido-flex abastecida com etanol.
Diferentemente da estratégia de rivais que utilizam kits semimontados (SKD) ou completamente desmontados (CKD), a GWM optou por importar componentes peça a peça. O formato exige maior integração de cadeia, mas permite utilizar benefícios fiscais como o ex-tarifário e os incentivos do programa Mover, além de facilitar a nacionalização gradual de peças eletrônicas, câmeras e sensores.

Imagem: neofeed.com.br
Ajustes de tarifas e tensão entre montadoras
Enquanto as marcas da China avançam, fabricantes tradicionais enfrentam queda de 10% nas vendas no varejo de veículos produzidos no Brasil no primeiro semestre de 2025. Esse desempenho levou a Anfavea a revisar a projeção de crescimento do mercado interno no ano de 6,3% para 5%, estimativa de 2,765 milhões de unidades.
O cenário de concorrência ficou mais acirrado após a alta gradativa do imposto de importação para veículos eletrificados, que era zero até 2024, passou para cerca de 20% em 2025 e deve atingir 35%. Mesmo assim, consultorias do setor avaliam que as margens das marcas chinesas continuam elevadas, sustentadas por escala global e menor custo de produção.
A discussão sobre tarifas ganhou visibilidade quando a BYD solicitou redução temporária de imposto para kits SKD e CKD destinados à fábrica em Camaçari (BA). A Anfavea reagiu, alegando risco a R$ 180 bilhões em investimentos e milhares de empregos no parque industrial local. Após pressão de ambos os lados, o governo federal adotou solução intermediária: negou isenção de três anos, mas liberou cota de importação com alíquota zero de US$ 463 milhões até janeiro de 2026 e antecipou a aplicação da alíquota máxima de 35% para veículos desmontados de julho de 2028 para janeiro de 2027.
Motivos para a expansão chinesa
Analistas apontam fatores internos e externos para a escalada da participação chinesa. No mercado internacional, montadoras da China buscam destinos para seu excedente de produção diante de barreiras tarifárias nos Estados Unidos e na Europa. No Brasil, o segmento de veículos elétricos e híbridos ainda é considerado recente, o que abre espaço para fabricantes que dominam essa tecnologia e conseguem oferecer preços abaixo dos concorrentes ocidentais.
Além disso, a maior parte da disputa ocorre em faixas de preço superiores aos carros de entrada, reduzindo a sobreposição direta com modelos compactos tradicionais. Embora a alíquota de importação mais alta pressione os preços finais, consultores avaliam que a competitividade tecnológica, o design diferenciado e a estratégia de pós-venda robusta tendem a sustentar o avanço das marcas chinesas.
A médio prazo, especialistas do setor acreditam que nem todas as 16 marcas permanecerão no país, mas as que consolidarem redes de distribuição, oferta local e base de fornecedores deverão ampliar participação, mesmo diante do aumento da carga tributária. Para a indústria nacional, o movimento funciona como alerta sobre a necessidade de acelerar projetos de eletrificação e inovação para preservar espaço no mercado.