Julgamento de Jimmy Lai entra em fase final, mas é adiado por tempestade em Hong Kong

Julgamento de Jimmy Lai entra em fase final, mas é adiado por tempestade em Hong Kong

O empresário de mídia Jimmy Lai, de 77 anos, enfrenta a etapa decisiva de seu processo por suposto conluio com forças estrangeiras em Hong Kong. As alegações finais estavam marcadas para esta quinta-feira (05), porém o tribunal suspendeu a sessão após a emissão de um alerta “preto” de chuva torrencial, o nível máximo na escala local, causado pela passagem de um tufão.

Lai é o réu mais conhecido acusado sob a Lei de Segurança Nacional imposta por Pequim em 2020. Se considerado culpado, poderá ser condenado à prisão perpétua. Detido desde dezembro de 2020, o fundador do jornal Apple Daily e da revista Next nega ter violado a legislação, que tipifica crimes como secessão, subversão, terrorismo e conluio com potências estrangeiras.

O caso tem repercussão internacional. O primeiro-ministro britânico, Sir Keir Starmer, pediu a libertação imediata do empresário, que possui cidadania britânica além da chinesa. O governo de Pequim, entretanto, não reconhece dupla nacionalidade e afirma que Lai é exclusivamente cidadão chinês. Organizações de direitos humanos denunciam o uso da lei para silenciar a oposição, enquanto autoridades de Hong Kong sustentam que a norma é essencial para restaurar a estabilidade após os protestos em massa de 2019.

Filho do acusado, Sebastien Lai, percorre diversos países para mobilizar apoio. Em fevereiro, ele classificou o processo como “praticamente uma sentença de morte”, caso o pai receba mesmo uma pena de cinco anos, em razão da idade avançada e de questões de saúde. O filho sustenta ainda que a situação é um teste para as relações entre Reino Unido e China.

Jimmy Lai construiu uma trajetória incomum entre os grandes empresários de Hong Kong. Nascido em Guangzhou, no sul da China, ele pertencia a uma família abastada que perdeu todos os bens após a vitória comunista em 1949. Aos 12 anos, fugiu do continente escondido em um barco de pesca e chegou à então colônia britânica sem recursos. Trabalhando em pequenos serviços, aprendeu inglês por conta própria e, anos depois, fundou a rede de roupas Giordano, transformada em marca internacional de grande sucesso.

A repressão ao movimento estudantil da Praça da Paz Celestial, em Pequim, em 1989, marcou uma virada em sua atuação pública. Revoltado com a ação do Exército, Lai passou a escrever artigos críticos ao governo chinês e inaugurou uma editora que se converteria num influente conglomerado de mídia pró-democracia. Apple Daily, lançado em 1995, tornou-se um dos jornais mais lidos do território, conhecido por fiscalizar autoridades e defender liberdades civis.

A postura frontal atraiu retaliações. Parte de seus pontos de venda na China continental foi ameaçada de fechamento, o que levou Lai a vender a Giordano e concentrar esforços na imprensa. Nos anos seguintes, a residência do magnata e o prédio do grupo Next Digital sofreram ataques incendiários. A polícia também desbaratou um plano de assassinato contra ele. Apesar das ameaças, o empresário continuou participando de manifestações públicas e concedendo entrevistas críticas a Pequim.

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Imagem: bbc.com

Quando a controversa Lei de Segurança Nacional entrou em vigor, em junho de 2020, Lai classificou a medida como o “sino de finados” das liberdades de Hong Kong e alertou que, sem um sistema jurídico independente, a reputação do centro financeiro internacional ficaria comprometida. No ano seguinte, publicou na capa do Apple Daily um apelo ao então presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, solicitando intervenção a favor do território.

Além do processo atual por conluio, o empresário já recebeu condenações por assembleia não autorizada e fraude relacionadas a protestos de 2019 e à gestão de sua companhia. Desde a prisão, permanece em regime de isolamento na penitenciária de segurança máxima de Stanley. Segundo seus advogados, ele enfrenta problemas de saúde, agravados pela idade.

O julgamento, presidido por três juízes designados pelo executivo de Hong Kong para casos de segurança nacional, é realizado sem a presença de júri, prática permitida pela lei de 2020. Promotores sustentam que artigos, entrevistas e contatos de Lai com autoridades estrangeiras configuram apoio a sanções contra a China, o que enquadrariam como conluio. A defesa argumenta que o acusado apenas exerceu o direito de liberdade de expressão.

Observadores externos, como União Europeia e Estados Unidos, afirmam que o processo simboliza a erosão do modelo “um país, dois sistemas” acordado antes da transferência de soberania do Reino Unido para a China, em 1997. Já o governo chinês reitera que a lei é indispensável para proteger a segurança nacional e preservar a prosperidade da cidade.

Com a suspensão desta quinta-feira, o tribunal ainda não informou a nova data para a retomada das alegações finais. A expectativa é que a sentença seja anunciada ainda em 2024.

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