Enviado de Trump visita pela primeira vez ponto de distribuição de ajuda da GHF em Gaza
O enviado do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, para o Oriente Médio, Steve Witkoff, entrou em Gaza na sexta-feira (data local) para inspecionar um ponto de distribuição de ajuda administrado pela Gaza Humanitarian Foundation (GHF). Foi a primeira vez que um representante de alto nível do governo norte-americano visitou fisicamente uma dessas estruturas, que recebem apoio logístico de Washington e de Israel.
De acordo com Witkoff, o objetivo foi reunir informações de “primeira mão” sobre as condições humanitárias e apresentar a Trump um panorama que ajude a preparar um plano de envio de alimentos e suprimentos médicos. A visita ocorreu em um centro próximo a Rafah, no sul do território, e contou com o acompanhamento do embaixador dos EUA em Israel, Mike Huckabee, e de militares das Forças de Defesa de Israel (IDF).
Em mensagem publicada na rede social X após a inspeção, o enviado afirmou ter passado “mais de cinco horas” dentro de Gaza, avaliando a situação e se reunindo com representantes da GHF e de outras agências. Huckabee, por sua vez, declarou que o sistema estaria fornecendo “mais de um milhão de refeições por dia” e classificou a logística como um “feito incrível”. Segundo a própria GHF, 1,3 milhão de refeições foram distribuídas na quinta-feira em três centros; números de sexta-feira ainda não foram divulgados. A Organização das Nações Unidas considera o volume insuficiente para cobrir as necessidades calóricas da população.
Os locais operados pela GHF tornaram-se foco de críticas devido a relatos frequentes de disparos próximos às filas de espera. O Escritório de Direitos Humanos da ONU (OCHR) estima que, desde a ativação dos centros em maio, 859 palestinos morreram nos arredores dessas instalações, parte de um total de 1.373 mortes relacionadas à busca por alimentos em Gaza. A fundação contesta as estatísticas, e Israel sustenta que seus soldados realizam apenas tiros de advertência, negando intenção de atingir civis.
O acesso de jornalistas estrangeiros à Faixa de Gaza continua bloqueado por Israel, o que dificulta a verificação independente das informações. Moradores ouvidos à distância classificaram a presença de Witkoff como “encenação midiática”. Entre as críticas, destacam-se alegações de que o representante não teria testemunhado o quadro de fome generalizada nem apresentado soluções concretas para o cerco ou para a suspensão dos bombardeios.
As operações da GHF também enfrentam acusações vindas de ex-funcionários. O tenente-coronel reformado Anthony Aguilar, veterano das forças especiais dos EUA que atuou em centros da fundação, disse à BBC ter presenciado uso “indiscriminado” de força contra civis desarmados. A organização chamou o relato de “categoricamente falso” e afirmou que Aguilar foi desligado por má conduta, o que ele nega.
Na sexta-feira, a Human Rights Watch (HRW) acusou militares israelenses e contratados financiados pelos EUA de instituir um modelo de distribuição “militarizado e falho” que transforma a entrega de ajuda em eventos “recorrentes de derramamento de sangue”. A entidade pediu a suspensão imediata do emprego de força letal contra civis e a interrupção das operações nos centros da GHF.

Imagem: bbc.com
Os quatro pontos de distribuição da fundação substituíram, em maio, o mecanismo anteriormente conduzido pela ONU. Localizados em zonas militares israelenses, eles são geridos por empresas de segurança privadas norte-americanas. Israel justificou a mudança afirmando que o grupo Hamas se apropriava de parte da ajuda das Nações Unidas, acusação rejeitada pelo movimento palestino.
Além das mortes registradas nos arredores dos centros, o Hamas-run Civil Defence relatou pelo menos dez óbitos em Khan Younis e Deir al-Balah, após ataques aéreos contra tendas de deslocados, e outros dois mortos — além de 20 feridos — quando forças israelenses abriram fogo perto do corredor de Morag, também vinculado à distribuição de suprimentos. O exército israelense foi procurado, mas ainda não se pronunciou.
Ainda segundo o Ministério da Saúde administrado pelo Hamas, 82 pessoas morreram em Gaza nas 24 horas anteriores ao balanço de sexta-feira; 52 delas estariam tentando obter alimentos. Agências da ONU alertam que a fome em larga escala no território é consequência direta de bloqueios e da destruição de infraestrutura.
Antes de seguir a Gaza, Witkoff reuniu-se em Jerusalém com o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu. Fontes israelenses mencionaram discussões sobre um novo formato de cessar-fogo, apelidado de “acordo completo”, que incluiria a libertação simultânea de todos os reféns mantidos pelo Hamas e o desarmamento total do grupo. Hamas afirma que não retomará negociações até que a entrada de ajuda seja ampliada. Estados Unidos e Israel se retiraram da última rodada de diálogos na semana passada, acusando a facção palestina de falta de coordenação, enquanto o Hamas responsabiliza Israel por intransigência.
Enquanto as iniciativas diplomáticas avançam lentamente, o quadro humanitário em Gaza se deteriora. A ONU classifica a situação como “fome induzida pelo homem”, ressaltando que a escassez de alimentos, medicamentos e combustível persiste apesar dos esforços de agências internacionais e organizações locais, incluindo a própria GHF.