A história de Akakor, suposta metrópole escondida na Floresta Amazônica, reúne relatos de civilizações pré-históricas, refugiados nazistas, túneis subterrâneos e uma série de desaparecimentos nunca esclarecidos. O mito ganhou projeção internacional nos anos 1970, quando o correspondente alemão Karl Brugger acreditou nas narrações de um homem que se dizia herdeiro de um povo desconhecido.
Segundo a lenda, a cidade teria sido fundada por seres extraterrestres por volta de 15 000 a.C. e, milênios depois, abrigado cerca de 2 000 nazistas que teriam deixado a Alemanha na década de 1930. Os recém-chegados viveriam em túneis ao lado dos nativos, protegidos por uma tribo chamada Ugha Mongulala. Akakor seria conectada a duas “cidades irmãs” — Akahim, no noroeste da Amazônia, e Akanis, na península de Yucatán, no México — por galerias subterrâneas, e sua localização exata ficaria entre Brasil, Peru e Bolívia, oculta atrás de uma cachoeira quase inacessível.
O encontro que acendeu o mito
Em meados de 1971, Brugger encontrou o autodenominado Tatunca Nara em um bar de Barcelos, a 370 quilômetros de Manaus. O homem, branco e fluente em alemão, afirmava ser filho de um príncipe Ugha Mongulala com uma freira alemã. Dizia também conhecer o caminho até Akakor, reconhecível por montanhas em forma de pirâmide. Para o jornalista, a narrativa poderia render a reportagem de sua vida.
Empolgado, Brugger organizou uma expedição que incluiu o então cinegrafista Jorge Bodanzky. A jornada, porém, terminou ainda em Barcelos: Tatunca prometeu buscar autorização dos líderes de sua tribo, desapareceu e o grupo teve de regressar. Apesar do fracasso, Brugger manteve a convicção de que a cidade existia e, em 1976, lançou o livro Crônica de Akakor, baseado nos relatos do guia. O prefácio foi assinado por Erich von Däniken, autor de “Eram os Deuses Astronautas?”, e a obra repercutiu entre grupos esotéricos e de contracultura.
A narrativa despertou curiosidade de figuras como Jacques Cousteau e, anos mais tarde, inspirou o filme “Indiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal” (2008). Ao mesmo tempo, aventureiros passaram a chegar à Amazônia em busca de Tatunca e da cidade perdida — com desfechos trágicos.
Desaparecimentos e morte
O primeiro episódio associado à lenda ocorreu em setembro de 1971, quando um avião caiu em Sena Madureira (AC), matando 33 pessoas, entre elas o bispo Giocondo Grotti, que guardaria documentos fornecidos por Tatunca. Na década seguinte, multiplicaram-se os casos de estrangeiros que desapareceram depois de contatar o suposto indígena. Em 1980, o norte-americano John Reed avisou a família que estava “a dois dias” de Akakor e nunca mais foi visto. Três anos depois, o suíço Herbert Wanner sumiu durante uma expedição; seu corpo foi encontrado em 1984 com um tiro na cabeça. Em 1987, a professora alemã de ioga Christine Heuser entrou sozinha na selva após romper com Tatunca e também não retornou.
O próprio Brugger foi morto a tiros em Ipanema, no Rio de Janeiro, em 1.º de janeiro de 1984. Ele deixara o cargo de correspondente e planejava viver na Amazônia para continuar a busca. Testemunhas relataram que o jornalista foi baleado quando tentava pegar a carteira; o projétil atingiu o peito, exatamente sobre uma tatuagem de tartaruga idêntica à do guia. O suspeito, reconhecido como morador da comunidade Cantagalo, não foi julgado, e o caso permanece sem solução.

Imagem: terra.com.br
A verdadeira identidade de Tatunca
Investigações posteriores revelaram que Tatunca Nara se chamava Hans Günther Hauck. O alemão abandonara a família nos anos 1960 e assumira a falsa identidade na Amazônia. Ministério Público do Amazonas e Polícia Criminal Federal da Alemanha o investigaram por homicídios e desaparecimentos, mas os processos foram arquivados.
Nenhum vestígio arqueológico
Apesar do interesse popular, pesquisadores não encontraram indícios concretos da cidade. O arqueólogo Filippo Stampanoni Bassi, diretor do Museu da Amazônia, afirma que tecnologias de mapeamento remoto não apontam pirâmides nem túneis complexos na região brasileira. Indígenas familiarizados com mitos locais, como Arlindo Maia, relatam nunca ter ouvido falar de Ugha Mongulala.
Há hipóteses de que Hauck tenha atuado como informante do regime militar brasileiro ou de que grupos estrangeiros buscassem minerais estratégicos, como urânio, na região. Entretanto, nenhuma dessas teorias foi comprovada. A história continua a atrair interesse acadêmico e midiático: o documentarista Rapha Erichsen lançou recentemente o livro O enigma de Akakor: Farsas e segredos na Floresta Amazônica, resultado de viagens por rotas associadas à lenda; em 2024, emissora pública alemã exibiu novo documentário sobre o tema.
Mais de cinco décadas após o primeiro relato, Akakor permanece sem evidência material. Hans Hauck, ainda conhecido como Tatunca Nara, vive em Barcelos e oferece excursões a quem queira percorrer os caminhos que, assegura, levam à enigmática cidade subterrânea.